05 novembro 2007

Como identificar os alunos que sofrem do distúrbio de atenção e ajudá-los a continuar aprendendo A sala de aula ele é o "pestinha": arranca os brinquedos dos colegas, anda de um lado para o outro, não fica mais de dois minutos sentado no mesmo lugar. Nunca termina as tarefas solicitadas e sai da sala várias vezes sem pedir licença. Em algumas ocasiões, chega a ser agressivo. Esse comportamento, geralmente confundido com indisciplina, é característico de um distúrbio de atenção que atinge cerca de 5% das crianças e adolescentes de todo o mundo: a hiperatividade. Conhecer os sintomas e aprender a lidar com esse problema é uma obrigação de qualquer professor que não queira causar danos a seus alunos. Afinal, a demora em diagnosticar o caso pode trazer conseqüências sérias para o desenvolvimento da criança. Alan Akel, de 12 anos, sofria nas aulas e teve de atrasar seu aprendizado (hoje está numa classe intermediária entre a 3a e a 4a série) porque a direção da escola que freqüentava, em São Paulo, não identificou que havia algo de errado em seu comportamento. Os pais foram obrigados a retirá-lo do estabelecimento e só descobriram que o filho era hiperativo quando a direção de outro colégio os orientou a procurar um médico. Embora prejudique a capacidade de concentração e atenção, a hiperatividade é facilmente tratável. Além da medicação, a reorientação pedagógica na escola ajuda o aluno a não perder rendimento. Alan, por exemplo, apresentou melhoras assim que passou a ter um atendimento especial. "Ele é inteligente e consciente de seu problema, o que faz com que controle melhor a instabilidade emocional", afirma Egle Mazzocchi de Souza, coordenadora pedagógica da Essência Equipe de Ensino, onde ele estuda numa turma com apenas seis crianças e dois professores. Segundo o psiquiatra Ênio Roberto de Andrade, coordenador do Ambulatório de Transtornos de Deficiência de Atenção do Hospital das Clínicas, de São Paulo, a hiperatividade só fica evidente no período escolar, quando é preciso aumentar o nível de concentração para aprender. "O diagnóstico clínico, no entanto, deve ser feito com base no histórico da criança", explica. "Por isso, a observação de pais e professores é fundamental." Geralmente, os hiperativos se mexem muito durante o sono quando bebês. São mais estabanados assim que começam a andar. Às vezes, apresentam retardo na fala, trocando as letras por um período mais prolongado que o normal. Em casa, esses sintomas nem sempre são suficientes para definir o quadro. Na escola, porém, eles são determinantes. O distúrbio ainda não tem uma causa única comprovada. Sabe-se que a origem é genética e que seus portadores produzem menos dopamina, um neurotransmissor responsável pelo controle motor e pelo poder de concentração, que atua com maior intensidade nos gânglios frontais do cérebro. Isso explica o fato de os hiperativos não se concentrarem e esquecerem facilmente o que lhes é pedido. Pela alta incidência em meninos — cerca de 80% dos casos —, acredita-se que o problema possa estar relacionado também ao hormônio masculino testosterona. Três fatores principais ajudam a distinguir o hiperativo da criança que tem apenas um distúrbio de atenção mais leve e daquela que busca apenas chamar a atenção: a contínua agitação motora, a impulsividade e a impossibilidade de se concentrar, seja em brincadeiras ou em atividades pedagógicas. Essas atitudes devem ser constantes durante pelo menos seis meses seguidos (leia no quadro ao lado outros sintomas típicos). Rotina estimulante e regras claras ajudam a controlar a excitação "Os professores que têm alunos hiperativos precisam de paciência e disponibilidade, pois eles exigem tratamento diferente, mais atenção e uma rotina especialmente estimulante", afirma Regina Borella, orientadora pedagógica do Colégio Pueri Domus, de São Paulo. Ela viveu essa situação quando Vicente*, de 5 anos, foi matriculado no Pueri. Os pais chegaram avisando que o filho precisava de limites claros, pois era "desobediente e mal-educado". Bastaram dois meses para a educadora suspeitar de hiperatividade. A escola, então, sugeriu aos pais uma consulta com um psiquiatra ou neurologista para confirmar o diagnóstico e, simultaneamente, passou a trabalhar de forma diferenciada com o garoto. Ele era colocado junto de alunos mais tranqüilos, para que sua agitação não encontrasse seguidores, e nas atividades de roda a professora estava sempre ao seu lado. Regina chegou a criar uma regra contra as "fugas" da sala: todas as manhãs, Vicente faz três riscos com giz no quadro-negro. É o número de vezes que pode sair. Sempre que se levanta, ele apaga uma das marcas. O limite funcionou. Hoje, o menino se controla mais antes de deixar a classe. Nem sempre os pais admitem que o filho é hiperativo. "Muitos acham que a criança é esperta demais e, por isso, está sempre interessada em novidades", afirma Helena Samara, diretora da Escola Móbile, de São Paulo. "Além disso, eles acreditam que o tratamento com medicamentos pode tirar a espontaneidade do pequeno." Helena tem dois alunos nessa situação matriculados em suas turmas. Para um deles, a escola desenvolve sozinha um trabalho pedagógico intensivo, pois os pais não aceitam o diagnóstico. Dificuldade para convencer alguns pais de que os filhos sofrem do problema "Em casos leves, o distúrbio pode ser tratado apenas com terapia e reorientação pedagógica", diz o psiquiatra Ênio de Andrade. "Os casos graves necessitam de tratamento com medicamentos." O tratamento é feito por um período mínimo de dois anos, mas deve durar até a adolescência, quando os sintomas diminuem ou desaparecem, graças ao amadurecimento do cérebro, que equilibra a produção da dopamina. Para a psicóloga Mônica Duchesne, da Associação Brasileira do Déficit de Atenção, outra conseqüência da hiperatividade é a baixa auto-estima das crianças, que surge quando elas notam que são diferentes das demais — em alguns casos, são as únicas a não concluir o dever. "Isso pode criar um estigma que traz repercussões sociais", analisa. O aluno Matheus*, da Móbile, cujos pais também refutam o diagnóstico de hiperatividade, sofreu essas conseqüências. Ele se sentia inferior porque era repreendido por seu comportamento agressivo. As professoras, então, começaram a elogiar o que ele produzia. Seis meses depois, Helena Samara notou diferença: "Ele está afável com os amigos e já relata em casa o que faz na escola, sinal de que sua percepção aumentou". se a hiperatividade não for adequadamente tratada na infância, pode deixar seqüelas na fase adulta, como desorganização para executar tarefas e rotinas diárias, distração excessiva, sonolência diurna e cansaço mental. Além disso, a pessoa corre o risco de se tornar hipersensível a críticas e irritadiça, apresentar aparente falta de motivação e rancor exagerado, bem como problemas de memorização.